Lágrimas de crocodilo <br> também na Tunísia

Carlos Lopes Pereira

A Grã-Bre­tanha vai re­forçar ainda mais as me­didas in­ternas de se­gu­rança e anun­ciou uma res­posta de «grande al­cance» contra o «ter­ro­rismo» is­lâ­mico.

A ameaça surgiu de­pois do ataque, na sexta-feira, a uma es­tância tu­rís­tica perto de Susa, na Tu­nísia, que custou a vida a uma trin­tena de ci­da­dãos bri­tâ­nicos. Um jovem tu­ni­sino, em­pu­nhando uma me­tra­lha­dora, dis­parou sobre tu­ristas na praia, ma­tando 38 pes­soas e fe­rindo ou­tras quatro de­zenas.

Iden­ti­fi­cado como Sei­fed­dine Rezgui, de 23 anos, foi aba­tido pelas au­to­ri­dades tu­ni­sinas e, se­gundo o El País, de Ma­drid, não terá ac­tuado so­zinho. A po­lícia tu­ni­sina já de­teve vá­rios «sus­peitos» que po­de­riam ser co­ni­ventes no aten­tado. O Mi­nis­tério do In­te­rior pediu ajuda à po­pu­lação para cap­turar «dois pe­ri­gosos ter­ro­ristas», cujos nomes e fo­to­gra­fias foram di­vul­gados através dos media.

Um jornal tu­ni­sino, Le Temps, dá por­me­nores sobre o jovem Rezgui. Ori­gi­nário de Ga­a­four, uma pe­quena al­deia no No­ro­este do país, a 80 qui­ló­me­tros da ca­pital, fre­quentou o En­sino Su­pe­rior na ci­dade santa de Kai­ruan. Antes de ser as­so­ciado a cír­culos is­lâ­micos ra­di­cais, «dan­çava break-dance e gos­tava do Real Ma­drid». Em redes so­ciais como o Twitter e o Fa­ce­book, ma­ni­fes­tava desde há muito sim­pa­tias pela «guerra santa» do Islão.

À ra­di­o­te­le­visão BBC, o pri­meiro-mi­nistro David Ca­meron disse que o ex­tre­mismo is­la­mita «de­clarou guerra à Grã-Bre­tanha» e ataca os ci­da­dãos bri­tâ­nicos em casa e no es­tran­geiro. «Somos um seu ob­jec­tivo», afirmou, re­fe­rindo-se ao grupo Es­tado Is­lâ­mico (EI), que rei­vin­dicou a au­toria do aten­tado. Ca­meron pro­meteu uma res­posta de «grande al­cance» e de­fendeu o seu en­vol­vi­mento na luta contra o EI no Iraque – e na Síria –, onde a avi­ação bri­tâ­nica é a que mais bom­bar­de­a­mentos efectua, de­pois da norte-ame­ri­cana. E onde, no ter­reno, há cen­tenas de con­se­lheiros mi­li­tares in­gleses.

A mi­nistra do In­te­rior bri­tâ­nica, The­resa May, vi­sitou já o hotel Im­pe­rial Marhaba, nos ar­re­dores de Susa, onde ocorreu a car­ni­fi­cina, e falou de «um des­pre­zível acto de cru­el­dade». O go­verno de Lon­dres, ex­plicou, está de­ci­dido a der­rotar os au­tores do ataque. «Os ter­ro­ristas não ven­cerão», ga­rantiu May, que se reuniu com os seus ho­mó­logos da Tu­nísia, Ale­manha, França e Bél­gica, países que também contam ví­timas mor­tais em Susa.

Hi­po­crisia oci­dental

O jornal The Guar­dian no­ti­ciou en­tre­tanto que o go­verno bri­tâ­nico vai ace­lerar as me­didas se­cu­ri­tá­rias, pre­vistas no pro­grama elei­toral com que os con­ser­va­dores ob­ti­veram a mai­oria ab­so­luta nas le­gis­la­tivas de Maio. Visam com­bater as men­sa­gens «ex­tre­mistas» nas redes so­ciais e proibir ac­ti­vi­dades de or­ga­ni­za­ções «ex­tre­mistas, não ne­ces­sa­ri­a­mente vi­o­lentas».

Também na Tu­nísia estão a ser adop­tadas novas me­didas de se­gu­rança, «do­lo­rosas mas ne­ces­sá­rias», nas pa­la­vras do pre­si­dente Beyi Caid Es­sebi, de 88 anos, que li­dera o pro­cesso de nor­ma­li­zação cons­ti­tu­ci­onal no país, após a con­tur­bada «pri­ma­vera árabe» que eclodiu em 2011.

O go­verno – no­meado há seis meses e des­gas­tado por greves la­bo­rais e pro­testos po­pu­lares – mo­bi­lizou cen­tenas de po­lí­cias e sol­dados para vi­giar praias, mu­seus e ou­tros lo­cais tu­rís­ticos. Ao mesmo tempo, de­ter­minou o en­cer­ra­mento de 80 mes­quitas sa­la­fistas e de as­so­ci­a­ções laicas de­mo­crá­ticas e proibiu ho­mens com menos de 35 anos de vi­ajar para a vi­zinha Líbia. Ali se mo­vi­mentam grupos ra­di­cais is­lâ­micos que ale­ga­da­mente re­crutam e treinam jo­vens «ter­ro­ristas» tu­ni­sinos.

Estas me­didas não im­pe­diram a de­ban­dada da Tu­nísia de mi­lhares de tu­ristas oci­den­tais. A mi­nistra do Tu­rismo, Selma El­loumi, clas­si­ficou o ataque de Susa como «uma ca­tás­trofe eco­nó­mica», que afundou as es­pe­ranças do país norte-afri­cano de re­cu­perar das con­sequên­cias do ataque ao Museu do Bardo, em Tunes, em Março, igual­mente contra tu­ristas (22 mortos).

É claro que a Grã-Bre­tanha aplaude tais me­didas de cariz au­to­ri­tário. Na edição de do­mingo, The Ob­server es­crevia que «é no me­lhor in­te­resse do Oci­dente fazer tudo o que pode para evitar que a Tu­nísia siga os passos da Líbia para a ins­ta­bi­li­dade cró­nica, des­per­tando uma nova vaga de mi­grantes no Me­di­ter­râneo».

Aqui, im­porta de­nun­ciar a hi­po­crisia oci­dental, também na Tu­nísia.

No quadro da sua po­lí­tica im­pe­ri­a­lista, os Es­tados Unidos, apoi­ados pelos seus ali­ados ha­bi­tuais – como a Grã-Bre­tanha – bom­bar­deiam, in­vadem, ocupam e des­troem es­tados como o Iraque e a Líbia. Tentam fazer o mesmo com a Síria. Mas­sa­cram po­pu­la­ções civis. Para atingir os seus ob­jec­tivos, criam, armam e treinam or­ga­ni­za­ções ter­ro­ristas como a Al-Qaida ou o Es­tado Is­lâ­mico. E, de­pois, quando há aten­tados bru­tais e san­gui­ná­rios como os da Tu­nísia, atri­buídos àqueles grupos, der­ramam lá­grimas de cro­co­dilo e «es­quecem-se» da sua res­pon­sa­bi­li­dade di­recta...




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